OESP
O 30º aniversário da promulgação do Ato Institucional nº 5, no próximo domingo, reaviva a memória e coloca sob luz, que define com quem realmente se trata, alguns personagens do drama que se viveu nos dias anteriores e nos subseqüentes. Creio que, para a História do Brasil, mais importante do que lembrar o que muitos viveram depois daquela noite fatídica – noite, sim, pois o Conselho de Segurança Nacional só conseguiu chegar a um acordo sobre o texto do Ato já tarde da noite, ele sendo lido pela rádio às 23 horas – é situar alguns problemas para quem se debruça sobre a História e pretende escrever de maneira isenta a história das intervenções militares na política brasileira.
O AI-5 foi produto da ação direta do “partido fardado”, que à época se costumava chamar de “linha dura”. Não se poderá conhecer de fato a história se não se lançar alguma luz sobre essa entidade. É o que pretendo fazer, sugerindo pistas a pesquisadores que não se deixem levar por ódios ou amores pelo que se passou.
A “linha dura” – depois passarei a chamá-la por seu verdadeiro nome – não é fruto dos acontecimentos que tiveram início em 1967 com o atentado no Aeroporto do Recife. Ela foi a propulsora do movimento de março de 64, se é que suas raízes não podem ser encontradas no golpe de 55 e na revoada de Jacareacanga, em 56. Quem a integrava? Basicamente, a reserva do Exército e a jovem oficialidade da força de terra e da Aeronáutica, a Marinha dando sua contribuição com alguns nomes de expressão na reserva, entre os quais o almirante Silvio Heck. O General Mourão Filho, que comandou as tropas rebeladas de Minas Gerais, foi apenas o instrumento de que a História se serviu para que tudo se passasse como se passou depois que ele entrou no Rio de Janeiro, na tarde de 31 de março – a eleição de Castelo Branco para a Presidência da República e a preeminência de Costa e Silva no então Ministério da Guerra, depois Ministério do Exército.
Depois que o Congresso declarou vago o cargo de Presidente – numa manobra do senador Auro de Moura Andrade aceita por quase todos -, os governadores que haviam apoiado o movimento (de memória, recordo-me dos do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul) decidiram apoiar a candidatura Castelo Branco pressionados pelos Coronéis do Exército que já compunham a então chamada “linha dura”, e respaldados em amplos setores da opinião. A escolha era entre Castelo, Dutra e Kruel, para não falar no Marechal Denys. A “linha dura” constituiu-se, não muito tempo depois, em oposição militar a Castelo, apoiada por Lacerda. Sobretudo à política de Bulhões e Roberto Campos. É importante lembrar que, enquanto o MDB e a esquerda sobrevivente acusavam Campos de “entreguista”, alguns homens da “linha dura” o viam como “comunista”, como aquele Coronel da FAB que se recordava de que, na crise entre Pequim e Taipé pela posse das Ilhas Quemoy e Matsu, Campos, então cônsul brasileiro, ficara com Pequim! Não era apenas oposição a Campos; era também a Golbery, que o Coronel reformado do Exército insinuava ter feito, nos dias que precederam o 11 de novembro de 1955, jogo duplo com Negrão de Lima e os que haviam ficado com Carlos Luz.
As circunstâncias levaram ao AI-2, que extinguiu os partidos e permitiu de novo a cassação de mandatos – mas manteve o habeas-corpus. A “linha dura” jamais se perdoou aquilo que chamava seu erro: ter delegado os poderes revolucionários a Castelo. Apesar de tudo, reconhecia nele o chefe, e houve quem, nas fileiras dessa entidade – que era mais um estado de espírito do que uma organização formal -, tivesse proposto a Castelo que sustentariam um novo mandato seu contra Costa e Silva, se dispensasse Golbery. Foram repelidos. Controlar Costa e Silva foi mais fácil.
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