OESP
Retomo as reflexões que ouvi durante concurso de que participei na Faculdade de Educação da USP. Elas se ajustam bem no atual quadro nacional em que se fala, há anos, que a Educação é o principal problema brasileiro, e se continua falando. Não desconheço, longe disso, esforços que vêm sendo feitos por governos e iniciativa privada. Nem seus resultados – alguns medíocres, outros excelentes, todos relativos quando se comparam custos e resultados.
O que mais me chamou atenção foi uma reflexão profunda sobre a velha Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Busco resumi-la, passados os dias e a memória enfraquecida. Mesmo assim, conservo bem viva a lembrança de que se disse, com todas as palavras, que a Faculdade cuidava de formar bons professores secundários e que, por isso – ademais, sendo o número de ginásios e escolas normais bem menor do que hoje -, o ensino era muito melhor. O formar bons professores não significava – e isto é o importante a reter – azucrinar os alunos com tantas e novas e novíssimas “pedagogias” e “didáticas”. Eram poucas. Quando me formei, no início dos anos 50, a licenciatura era apenas um ano: Didática Geral, Didática Especial (para cada ramo da ciência, uma) e Psicologia Educacional. O restante da grade curricular completava-se com as matérias de Sociologia, Política, Antropologia ou Economia, à escolha do aluno. Não diria que nossas virtudes eram tantas – digo nossas, porque prestei concurso e fui lecionar no interior, numa escola normal pública – como foram apregoadas. Dos poucos meses que passei no interior, afora a de ter uma péssima didática, guardo a impressão de que minhas alunas haviam tido um ginasial sofrível. Como lhes disse, os 20 anos autorizando todas as audácias: “Vocês mal sabem conjugar o verbo amar.”
A bem dizer as coisas, a Faculdade formava professores em turmas pequenas – quando ingressei, éramos 12. Antes de irmos – e havia os que ficavam – para o interior, quem dava aulas nos ginásios oficiais? O padre ensinava latim ou português; o médico, biologia ou similar – afora os professores que haviam entrado por concurso. Esses eram poucos. Recordo-me do grande trauma que foi para o ensino público paulista uma avaliação que se fez, não sei se em 1947/8 ou antes. Sei apenas que foi realizada no velho prédio da Caetano de Campos, onde funcionava a Faculdade. Vieram, tinham de vir, esses abnegados que ensinavam pelo interior. Quantas vezes, naqueles dias, ouvi, nos corredores, suas amargas queixas contra a “sabedoria” – ou o esnobismo – dos professores da Faculdade que os avaliavam e exigiam deles que soubessem tudo sobre o que eles, na Capital e na Faculdade, tinham acabado de ler.
Isso, porém, são memórias. Que se enquadram naquilo que foi dito. Depois dessa fase, que deve ter terminado em meados dos anos 50, o ensino público expandiu-se – e já não tinha quadros suficientes para manter a mesma qualidade. Além do que, na Faculdade, começaram a surgir especializações didáticas e pedagógicas – e creio que o saber Sociologia, Política, Antropologia ou Economia passou a ser menos importante. Essa observação é válida para os dias de hoje, depois que os salários do ensino oficial foram aviltados para que se pudesse atender a uma das “leis de Parkinson”: os quadros administrativos, burocráticos, devem hoje ser bem maiores do que o dos professores. E foi preciso pagar algum salário a todos… Digo que o saber a matéria que se ensinava passou a ser menos importante porque certa feita, quando o Instituto Liberal de São Paulo iniciava uma experiência de amparo ao ensino público, elaboramos apostilas de Física, Química e Matemática, que entregamos a alunos de um colégio do Taboão. Elas serviram para que o diretor selecionasse seus professores: “V. é capaz de dar este curso?” Muitos que se habilitavam, ou já estavam no ensino oficial, não eram.
Colocam-se computadores nas escolas, pensando na administração e nos alunos. Nos professores e na sua formação na matéria que irão ministrar, parece que se pensa pouco. E depois se exige muito do ensino público.
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